Cervejas especiais ganham espaço e caem no gosto do brasileiro

LIS COSTA

Colaboração para o UOL

Seja no carnaval, na praia ou em qualquer outro lugar, a cerveja está enraizada na cultura do brasileiro, que só em 2010 consumiu 13 bilhões de litros da bebida.

As chamadas Pilsen, as famosas loirinhas, ainda dominam a preferência nacional, mas aos poucos nomes como India Pale Ale e Weiss começam a cair na boca dos apreciadores de cerveja. Isso se deve à produção de microcervejarias nacionais e ao crescimento das importadoras especializadas, que apostam no poder gustativo dos rótulos especiais.

O mercado destas cervejas registra um aumento gradativo entre um público que se dispõe a pagar um pouco mais por mais qualidade e variedade na garrafa. Segundo a ABRABE (Associação Brasileira de Bebidas), o Brasil tem hoje 175 microcervejarias, concentradas principalmente no sul e sudeste do país.

Uma delas é a Bamberg, sediada em Votorantim (SP), que chega a produzir 40 mil litros por mês, entre a já conhecida Pilsen, a Weizen (de trigo), a Rauchbeer (com maltes defumados) e mais quatro variedades. "Depois de um boom que ocorreu na Europa e nos Estados Unidos, vi que esse era o negócio do futuro no Brasil", conta o sócio Alexandre Basso, que inaugurou a Bamberg em 2005.

Nesse mercado em franca ascensão, que deve atingir uma fatia de 2% dos consumidores de cerveja em dez anos, lojas, bares e restaurantes pegam carona no sucesso dos rótulos especiais para incrementar seus serviços. É o caso da Mr. Beer, loja com mais de 20 franquias espalhadas em shoppings de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Campinas, que comercializa cerca de 100 marcas da bebida, entre nacionais e importadas. "Queríamos oferecer um lugar de fácil acesso, com atendimento qualificado", conta Rodolfo Alves, um dos sócios da empresa.

O cliente que visita uma de suas lojas pode levar para casa desde uma Paulaner, cerveja de trigo alemã, por R$ 16,90 (500 ml), até a desejada Deus, rótulo belga que passa por segunda fermentação na garrafa, como um espumante, por R$ 200 (750 ml). Agora, Alves pensa em expandir a rede para lojas de rua, onde os clientes também podem saborear sua cerveja preferida na companhia dos quitutes da padaria paulistana Benjamin Abrahão.

A carta, por favor?

Além de bares, os restaurantes também começam a dedicar parte de seu cardápio às cervejas especiais. O paulistano Arturito, da chef Paola Carosella, oferece 11 opções de rótulos nacionais em sua carta, como a Colorado Appia, feita com trigo e mel de laranjeira, por R$ 15 (310 ml). "Cerca de 20 a 30% de nossos clientes optam pelas cervejas", diz Peter Ferreira, chefe de bar do Arturito.

Outras casas vão além no serviço: já mostram sugestões de harmonizações para cada um dos pratos, caso da Melograno Forneria e Empório de Cervejas, também em São Paulo. Calabresa ao forno acompanhada de uma India Pale Ale, de lúpulo e amargor intensos, e o panini com ragu de cordeiro harmonizado com uma Dubbel, com notas tostadas e carameladas, estão entre as opções mais pedidas na casa de Edu Passarelli, especialista na área que mantém um blog sobre o assunto.

A brincadeira ainda vai mais longe na Cervejaria Nacional, em São Paulo. No bar de três andares no bairro de Pinheiros, as cervejas são feitas na própria casa. São cinco sabores artesanais, cada um com o nome de um mito folclórico: Y-îara Pilsen, Kurupira Brown Ale, Sa'si Stout, Domina Weiss e Mula India Pale Ale. "Temos a opção de um sampler de degustação das cinco cervejas, para o cliente conhecer nossas variedades", diz Dudu Toledo, um dos sócios da casa, onde oito tanques de fermentação produzem até 10 mil litros das bebidas.

Faça Você Mesmo
Assim como o vinho, as cervejas especiais também despertam a curiosidade de aficionados, que desejam conhecer mais as variedades e riquezas da bebida. Muitos deles se reúnem em confrarias para conversar, beber e até fazer sua própria cerveja.

A ideia da cervejaria veio com o hobby do mestre cervejeiro Luis Fabiani, amigo de Toledo, que se apaixonou pelo universo dos goles artesanais na década de 1990, em Nova York. Ao voltar para o Brasil, passou a fazer cerveja em casa e acabou virando sócio de Toledo e do cunhado Peter Jancso ao abrirem a microcervejaria Nacional, que abastecia bares como o extinto pub Drake's, em São Paulo.

Mas engana-se quem acha que esse mundo é só rodeado de homens. A Maltemoiselles é uma confraria feminina de apreciadoras da capital paulista, que se encontram todo mês para trocar figurinhas sobre o assunto, em reuniões regadas a muita cerveja – escolhida de acordo com um tema pré-definido – e comidinhas.

As sete confreiras (a maioria blogueiras de gastronomia) também se une para elaborar a própria cerveja. "Já fizemos uma India Pale Ale, uma Weiss e uma Stout, todas engarrafadas e rotuladas", conta Tatiana Damberg, do blog Mixirica uma das participantes. O grupo recorre a bares com microcervejaria, como o Pier 1327, e a cervejarias-escola, como a Sinnatrah, para elaborar suas preciosidades, que demoram cerca de um mês para ficarem prontas – espera que vale a pena depois de cada gole.

Casamentos que funcionam

Queijos curados como parmesão pedem cervejas do estilo Stout ou Porter, que têm um leve residual adocicado. "Elas contrapõem o salgado do queijo e têm força para enfrentar um queijo forte", ensina o somellier Edu Passarelli

Queijos azuis, como o gorgonzola: cerveja do estilo Strong Golden Ale ou Champenoise, que trazem uma leve doçura e álcool potente para cortar a gordura do queijo
Espaguete ao Pesto: cerveja do estilo Tripel. Sua refrescância harmoniza com o manjericão e tem teor alcoólico mais elevado para quebrar a sensação de gordura do molho
Hambúrguer: cerveja do estilo Vienna Lager, em que os maltes sofrem caramelização na hora do cozimento, o mesmo que acontece com a carne. O amargor levemente acentuado também quebra a sensação de gordura
Frango assado: cerveja do estilo Munich Dunkel, com notas de tostados que casam bem com a pele crocante da ave, bem assada
Peixes e frutos do mar: cerveja do estilo Weiss, de alta refrescância e boa acidez, harmonizam com a leveza e maresia dos frutos do mar. A cerveja é leve e não se sobrepõe ao sabor dos pescados

Chocolate com cerveja

Diante desse público não só ávido pelo potencial gustativo, como também por informação sobre as cervejas especiais, o treinamento dado aos funcionários de lojas, bares e restaurantes é uma das chaves do sucesso para conquistar o cliente. "Hoje o mercado pede profissionais mais capacitados para o serviço da cerveja", explica a sommelier de cervejas e mestre cervejeira Cilene Saorin.

Um das grandes especialistas no assunto, Cilene conseguiu uma parceria entre a Doemens Akademie, escola alemã referência no mercado cervejeiro, e o Senac São Paulo para implementar o curso de sommelier de cerveja.

Inaugurado no final de 2010, o curso já formou mais de 120 profissionais, que passam 100 horas aprendendo sobre as escolas cervejeiras mais importantes e até sobre a responsabilidade social do profissional. "O sommelier de cervejas tem de entender que está lidando com o consumo de bebida alcóolica de seu cliente", justifica Cilene.

Uma das principais tarefas de um sommelier de cerveja, assim como o do vinho, é proporcionar as melhores harmonizações entre a bebida e a comida. E no vasto mundo das cervejas especiais, os casamentos podem ser inusitados. "Uma sobremesa com chocolate fica bem com cervejas com malte de torrefação intensa, como Schwarzbier, Stout e Porter", conta Edu Passarelli (veja dicas ao lado)

Até os tradicionais petiscos de bar ganham novos companheiros. "Uma Brown Ale tem notas de torrefação não tão intensas, que combinam com o frango temperado de uma coxinha", diz. E os tradicionais churrascos não serão mais os mesmos com uma Rauchbier "O malte defumado da cerveja é uma ótima companhia para as carnes na brasa", segundo o especialista.

Se quiser adentrar esse mundo tão rico das cervejas especiais, o público paulistano tem a oportunidade de conhecer mais de 100 rótulos da bebida durante a Beer Experience, feira que reunirá 18 microcervejarias e importadoras no Centro de Convenções Frei Caneca, em São Paulo, no próximo sábado (20).

O bebedor, além de adquirir exemplares a preço de custo, ainda participa de jogos ligados à cerveja. "Queremos fazer uma festa para o apreciador", diz Andre Cancegliero, sommelier de cerveja e um dos idealizadores do projeto.

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