Vilã ou mocinha? Uso de panela de pressão para cozinhar divide opinião de chefs

RAFAEL ILLUMINATO

Colaboração para o UOL

Não há uma dona de casa brasileira que não tenha pelo menos uma em sua cozinha. "É só olhar os presentes de casamento: ganhamos pelo menos umas cinco panelas de pressão", brinca Jefferson Rueda, marido de Janaina Rueda, a chef do Bar da Dona Onça, em São Paulo.

"Ih, se deixar, a Janaina, faz tudo na panela de pressão", entrega o chef Jefferson enquanto aguarda a chegada da esposa no Dona Onça.

Realmente, a chef do Dona Onça faz muitos de seus pratos com o utensílio. Rabada, Galinhada, Dobradinha, Língua, Caldo de Mocotó e Puchero são alguns deles. E ela mostra, com o maior orgulho, uma panela imensa, com capacidade para 30 litros.

Ao lado, fica sua coleção. "Olha essa azul, não é linda? É antiga, a dona me doou porque sabia que eu iria cuidar muito bem", aponta. E quantas possui? "Aqui no Dona Onça umas dez e, em casa, acho que mais umas dez. Deixa eu pensar... são 23 no total", contabiliza.

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    A FAVOR: a chef Janaína Rueda usa a panela em seu restaurante pois ela acelera cozimento

O funcionamento de uma panela de pressão é simples. Tampada, a pressão interna da panela aumenta, fazendo com que a água ferva a uma temperatura maior (veja gráfico abaixo).

"Ela pode chegar a 120 ºC. A cocção é acelerada geralmente em um terço do tempo necessário para o cozimento em uma panela convencional", conta Adriano Nogueira, professor de gastronomia do Centro Universitário Senac.

Ou seja, a panela de pressão serve para cozinhar certos alimentos -como carnes, sopas e feijão, só para citar os mais comuns- em tempo bem menor.

Mesmo assim, sua utilização provoca uma celeuma entre chefs e cozinheiros sobre o efeito causado nos alimentos.

Vilã ou mocinha?
Enquanto alguns defendem veementemente, outros a deprezam. Há também quem prefira seu uso em determinados casos, dependendo do tipo de alimento a ser feito. "Se não observado o tempo e a quantidade de líquido interno, o cozimento em panela de pressão pode dilacerar os alimentos fazendo-os perder o corte inicial definido", alerta o chef Samuel Bologna, do restaurante paulistano Pranzo.

"Uso a panela de pressão porque, sem ela, o tempo de preparo de alguns pratos iria demorar muito e eu atendo 80 mil pessoas por mês. Tem gente que fala que o alimento perde o aroma, mas muito pelo contrário: quando você abre a tampa, vem um cheiro maravilhoso. É só saber usar e deixar no tempo certo para a carne, por exemplo, ficar tenra", garante Janaina.

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    CONTRA: Renata Braune defende que o cozimento mais lento conserva a textura correta do alimento

Para Renata Braune, chef do Le Chef Rouge e professora do Atelier Gourmand, panela de pressão, nunca. "Sou contra o uso do utensílio justamente porque ela acelera o cozimento dos alimentos. Quanto mais lento, melhor o controle sobre as texturas desejadas e maior o seu sabor", explica.

Mas o que fazer com grãos e as carnes mais duras? Renata dá a dica: "No caso dos grãos, como o feijão e o grão de bico, eles devem ficar de molho prévio, o que diminui o tempo de cozimento. Nas carnes, o ideal é pré-grelhar, selando-as bem, e deixar cozinhar lentamente no molho. Esse seria o melhor método de cozimento", ensina.

Se você é daqueles que não imagina cozinhar sem o famoso chiado do vapor, mas está disposto a testar novos resultados, opte então pelas panelas convencionais de paredes grossas, que possuem boa indução de calor. Elas mantêm o cozimento por igual e seguram o calor da chama do fogo. "Exemplos são as panelas de ferro, de inox com fundo duplo, de cobre e de pedra sabão", sugere Renata.

História

A primeira panela de pressão foi feita no século 16. "A maioria dos créditos vai para o francês Denis Papin", diz Nogueira. Segundo o professor, o primeiro exemplar do utensílio foi feito sem a válvula de pressão e, por isso, explodiu. "Depois disso, Papin foi muito criticado e aperfeiçoou-a com a válvula. Inicialmente, era usada para cocção de carnes, muitas vezes com ossos, com o objetivo de dar mais sabor e obter maior rapidez."

No Brasil, sua popularização aconteceu no período pós-segunda guerra mundial. "A mulher começou a assumir cargos na indústria e, com isso, precisava ganhar tempo para conciliar casa, filhos e trabalho. A panela de pressão foi introduzida nesse contexto", comenta o professor.

Na época, a demanda foi tanta que havia fila de espera para comprá-la. "Todo mundo queria fabricar a panela, pois era um ótimo negócio. Foram aparecendo algumas feitas com material inferior, a fim de baratear o custo e consequentemente, apareceram muitos acidentes..."

Quem nunca ouviu falar de uma panela de pressão "do amigo da vizinha da tia" que explodiu? Às vezes, não é preciso ir tão longe. "Eu já vi uma panela de pressão explodir. Abriu o teto por causa de um entupimento da válvula", conta Janaína Rueda.

Seja como for, para continuar usando a panela de pressão ou para comprar uma nova, é preciso tomar algumas precauções para evitar acidentes. Fique atento às dicas abaixo:

 

1 - "Nunca encha todo o espaço da panela: o alimento deve ocupar até, no máximo, dois terços de seu conteúdo", explica Ana Maria Costa, chef do Viver Casa & Gourmet

2 - Higienização adequada é também muito importante. "Quando lavar a tampa, é preciso retirar a borracha de vedação e lavá-la também. O pino e a válvula de segurança também devem estar sempre limpos", conscientiza Ana Maria. Como existem diferentes modelos no mercado, use o bom senso: pinos removíveis podem ser limpos separadamente e, no caso dos fixos, siga os procedimentos descritos no manual de instrução de sua panela.

3 - O anel de borracha ou silicone tem a função de vedar adequadamente para que a pressão dentro da panela aumente. Sua vida útil depende de sua utilização, mas, via de regra, possui durabilidade de dois anos. Depois disso, troque-o, levando a panela à assistência autorizada.

4 - Antes de abri-la, podemos levantar o pino ou colocá-la sob água para acelerar a saída do vapor? "O correto é desligar e deixar resfriar. A pressão sai, o vapor sai e ela não abre caso ainda haja pressão. Não é recomendável colocar na água ou levantar o pino por questões de segurança. A pessoa pode se queimar. E para que? Se há pressa, por que então não tirá-la do fogo três minutos antes?", questiona Ana Maria. 

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